terça-feira, 23 de outubro de 2018

134º GP França 1992. A batida de Schumacher em Senna



A BATIDA DE SCHUMACHER E O CARÃO DE SENNA NELE
A esperança de Ayrton Senna no Grande Prêmio da França estava na nova suspensão ativa, ou inteligente, de sua McLaren. Até brincou antes da classificação:“Vamos ver qual é o QI dela” Não foi suficiente, no entanto, para andar na frente das Williams: Mansell fez a sua sétima pole position na temporada e o brasileiro ficou em terceiro no grid.Também não deu para conferir a elevação da potência do novo motor que a Honda havia preparado para a corrida, pois Ayrton Senna abandonou na primeira volta. Preparava-se para tomar a primeira curva quando foi abalroado por Michael Schumacher.Foi uma corrida curta e uma decepção grande. Nigel Mansell venceu novamente, com Patrese  e Martin Brundle (Benetton) completando o pódio.



Briga de Ayrton Senna com Michael Schumacher
Já o segundo acontecimento foi o abalroamento  que o piloto brasileiro teve com o então jovem Michael Schumacher . Na oitava etapa, o GP da França , após a largada, ocupando a 4ª posição, Senna ia contornar a curva Adelaide, quando de repente foi atingido por trás pelo Benetton número 19; sem condições de sair do local, Senna abandonou a corrida prematuramente. Antes de começar a segunda largada, o brasileiro sem o macacão foi até o grid onde estava posicionado o carro do piloto. O tricampeão brasileiro queria conversar rapidamente com ele antes de dar entrevistas para a imprensa. Você fez uma cagada do tamanho de um bonde e me jogou para fora da pista  disse o piloto brasileiro ao jovem piloto alemão no meio da pista e com o dedo em riste. Embora Senna quisesse iniciar uma conversa amigável com Schumacher, o próprio piloto alemão não quis dialogar com o tricampeão naquele momento, porque não era o local e o momento adequado para essa discussão, já que o piloto da Benetton estava se concentrando com a equipe para a nova largada. Sem muito o que fazer, Senna deixou o local, pulou a mureta da pista e foi embora, deixando a imprensa internacional que estava ao seu redor sem dar maiores explicações
 Fonte: História de Ayrton Senna    http://www.ayrtonsenna.com.br/piloto/
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Senna X Schumacher, no braço. Palco: GP da França de 1992, Magny-Cours

Então com 23 anos, alemão tirou brasileiro tricampeão da prova logo na primeira volta com manobra desastrada; diante das câmeras, um irritado Ayrton foi tirar satisfações e repórter viu de perto

Por Livio Oricchio Le Castellet, França 24/06/2018


A corrida representou o segundo round da relação que viria a ser bastante tensa, ao longo dos anos, entre Ayrton Senna, da McLaren, e Michael Schumacher, Benetton. O direito de ser o primeiro round ficou com o GP do Brasil daquela temporada.
Senna estreou o modelo MP4/7-Honda em Interlagos, terceiro GP do calendário, a fim de tentar se aproximar um pouco dos pilotos da Williams, Nigel Mansell e Riccardo Patrese, muito mais rápidos que todos os demais. Na prova, com um carro quase sem testes, o motor Honda cortava.

Schumacher vinha imediatamente atrás de Senna, na reta dos boxes de Interlagos, e interpretou aquela súbita aproximação à traseira da McLaren como um brake test, ou seja, Senna estivesse tocando de leve no freio, na reta, para tentar levar Schumacher brecar forte e perder o controle da Benetton. - É difícil acreditar que um piloto como Senna, três vezes campeão do mundo, possa ainda fazer break test com os outros - acusou o alemão. Senna ficou sabendo da declaração de Schumacher pela imprensa, instantes depois apenas: - Falou isso, é? Pois o alemão falou besteira. Eu não fiz break test algum. O meu motor estava falhando, tanto que abandonei por essa razão. Antes de entrar no GP da França de 1992 em si, era importante mostrar que, com menos de um ano na F1, Schumacher já tinha desafetos. E do calibre de Senna, campeão em três dos quatro títulos anteriores disputados, 1988, 1990 e 1991.

Chega pra lá
Ainda na primeira volta, no fim da grande reta, na freada da curva Adelaide, Schumacher tentou ultrapassar Senna, por dentro, para assumir o quarto lugar. Senna havia perdido a terceira colocação para Berger na largada. Sem experiência, ainda, o alemão freou e, quando ambos iniciaram a curva, bastante lenta, o aerofólio dianteiro de Schumacher tocou o pneu traseiro direito de Senna, fazendo-o rodar. Outros pilotos se acidentaram naquela curva.
Mesmo sem o aerofólio dianteiro, Schumacher voltou aos boxes porque o restante do seu Benetton não foi atingido. Já Senna não teve como seguir na corrida. Assistiu às primeiras voltas da área de escape da curva Adelaide.
A corrida seguia seu curso quando na 16ª volta começou a chover forte, a ponto de a visibilidade cair bastante e o asfalto tornar-se extremamente escorregadio. O diretor de prova, Roland Bruynseraede, interrompeu a competição.
Agora vai ficar legal.
Senna já estava de roupas normais, pronto para deixar a área do autódromo, quando viu, na paralisação da corrida, a chance de ter uma conversinha com Schumacher. Quem conheceu Senna sabe que ele não esquecia quando alguém lhe fazia algo. Estava atravessada ainda na sua garganta a falsa acusação de Schumacher em Interlagos, exatamente três meses antes, e naquele momento, bem quente ainda, ter sido literalmente colocado para fora da prova. 
Atrás da notícia
Eu estava na cabine de transmissão da empresa para quem trabalhava, dentre outras atividades que exercia, quando dei sorte de ver, através do vidro, Senna sair dos boxes da McLaren e caminhar a pé até o grid, onde os carros estavam parando para depois, talvez, reiniciar a competição. Há vídeo dessa cena no Youtube.
Avisei o locutor que estava deixando a cabine e, com o meu gravador de fita cassete na mão, saí correndo para flagrar o primeiro contato entre Senna e Schumacher, em seguida ao alemão deixar o cockpit.
Olha que legal, hoje de manhã, aqui em Paul Ricard, bati um longo papo com Pat Symonds, o engenheiro de Schumacher na Benetton e que fora de Senna na Toleman. A equipe era a mesma, havia mudado o nome, apenas. Symonds riu comigo. Hoje esse conceituado engenheiro inglês faz parte do grupo de Ross Brawn, na FOM, que estuda uma profunda mudança nos regulamentos técnico e esportivos da F1 a partir de 2021.
- Quando eu vi Ayrton chegando, logo compreendi que aquilo poderia gerar uma briga mesmo. Eu me postei bem perto do Michael e lhe pedi para não reagir, ouvisse o que tinha de ouvir. Ayrton estava de cabeça quente, contou-me Symonds, e eu lhe lembrei que estávamos lado a lado.


Antes ainda de se aproximar de Schumacher, Senna já estava de dedo em riste e suas palavras, em tom ameaçador, foram exatamente estas, as ouvi de perto:
- Eu vim aqui porque eu te respeito como piloto. Mas também para te avisar que da próxima vez quem vai dar primeiro sou eu, não você, ok?
A cara de Schumacher, com seus 23 anos, dizia muito. Cabeça baixa. Foi como o vi em muitas ocasiões, a mais marcante na sala de imprensa do GP da Áustria, em 2002, depois de vencer após a Ferrari mandar Rubens Barrichello deixá-lo passar.
Com os dois pilotos ainda próximos da Benetton, Symonds colocou a mão no ombro de Senna e disse isto:
- Ayrton, eu vou pessoalmente conversar com ele.
Se naquele momento o alemão tivesse encarado Senna, com certeza teriam partido para a agressão física, o brasileiro estava realmente irritado.
Agora o Symonds de Paul Ricard:
- Michael era muito jovem ainda, cheio de gás, cometia erros. Depois de você me contar agora o que aconteceu, eu me lembrei, ele bateu na traseira de Ayrton. Recordo que tínhamos um ótimo carro.
De volta ao acontecimentos da pista, Schumacher diz algo a Senna, já levantando a cabeça, em tom bastante moderado. Não ouvi, até porque a essa altura eles já não estavam sozinhos, havia gente de todo lado. A chuva havia parado, segundos depois da bandeira vermelha.


Você está errado, ponto!
Senna pôe a mão no ombro de Schumacher e o leva para a lateral do grid. Os mecânicos, de todos os carros, trabalham para mandá-los de volta à corrida. Senna nos impede de registrarmos a conversa, empurra o braço de um repórter com o microfone. Mas, por eu estar muito perto, ouvi, sempre falando em inglês com Schumacher:
- Você está errado. Você está errado, não há o que discutir. Você não colocou o carro ao lado do meu, bateu na minha roda traseira, não foi nem uma tentativa de ultrapassagem. Você está errado, pergunte a quem você quiser. O tom de Senna é menos agressivo do que no começo das conversas.
O alemão fala algo e de novo não deu para ouvir. Flavio Briatore, um jovem dirigente da F1 então, se aproxima lentamente. Eu me lembro que me chamou a atenção o medo de Briatore chegar perto de ambos. Hoje, aos 68 anos, o italiano reside em Mônaco, e quando o encontro por lá, o que aconteceu em duas ocasiões, desde que deixou a F1, costumamos conversar. Briatore é o profissional que mais coisas me contou nesses meus quase 30 anos de F1. Muitas mesmo.
Vi que Senna e Schumacher mantiveram ainda aquele papo no grid, mas sem poder ouvi-los, me parecia a repetição do que já haviam falado um ao outro.

Com a imprensa brasileira

Falamos com Senna, nós da imprensa brasileira, na sequência, mas já no paddock, na parte de trás dos boxes. Antes, um grupo de meninos que aguardava Senna tentou obter um autógrafo do ídolo. Senna passou por eles sem olhar para os lados por causa da raiva que sentia de Schumacher.
Um pequeno grupo o acompanhou, e Senna parou:
- Meninos, já disse que não vou dar autógrafo agora, estou irritado, ok?
Vi aquilo e confesso que me senti doído, os meninos não tinham nada a ver com os problemas entre Senna e Schumacher. Veio até nós, jornalistas. Recordo de ter do meu lado Celso Itiberê, do jornal "O Globo". As palavras de Senna ainda guardo em mente. Foi algo assim:
- Esse alemão, que é bom, não vai chegar aqui e se impor como está achando. Se vocês observarem as imagens vão de cara entender que não foi uma tentativa frustrada de ultrapassagem, ele provocou um acidente, é diferente, ele me colocou para fora. E não fizeram nada contra ele. O.K. (deu a entender haver compreendido a regra do jogo).
Disse mais coisas que não me lembro.
Faz uns 15 anos, creio, achei uma caixa de fitas de gravador cassete com as entrevistas ou flagrantes que registrava na época. Com certeza em uma delas encontraria essa conversa, ao menos o que consegui gravar. Nas mudanças Brasil/Europa, essa caixa e muitas outras literalmente sumiram. Mas quem sabe eu ainda a encontre na casa da Mamma. Um documento que se perdeu.
Importante: sobre acidentes de pilotos, na época não existia nem 20% do rigor de hoje nos toques ocorridos na pista. Era preciso muito para os comissários tomarem alguma ação punitiva contra os pilotos. Acredito que se Senna acompanhasse um GP de perto hoje e visse que tudo pode gerar punição, é bem provável que desse risada.
Fama de mau caráter
Essa foi uma experiência interessante que tive com Schumacher e Senna. A maior, no entanto, nada teve a ver com a de Magny-Cours. Aconteceu muitos anos mais tarde, anos 2000. Um dia prometo contar. Eu entrevistaria Schumacher em São Paulo, em um hotel, na quinta-feira do fim de semana do GP do Brasil, para o jornal que trabalhava.
Minha estratégia era arriscada: ou a entrevista seria um marco ou ela talvez acabasse na primeira pergunta e ficasse sem nada. Schumacher literalmente iria embora. Como o conhecia há muitos anos, já o havia entrevistado em várias ocasiões, achei que valeria a pena correr o risco.
A pergunta:

- Michael, por que você acha que tem fama de ser mau caráter?
Não houve, a rigor, segunda pergunta. E a entrevista marcou época. Schumacher falou quase sem parar a maior parte do tempo, mais de 20 minutos, para desespero da assessora de imprensa, revoltado com o que algumas pessoas pensavam dele. Disse-me que outros pilotos, que tiveram comportamentos até piores que os seus, não foram punidos e ainda “tinham a imagem de santinho”.
Até a próxima.

 
 




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