A BATIDA DE
SCHUMACHER E O CARÃO DE SENNA NELE
A esperança
de Ayrton Senna no Grande Prêmio da França estava na nova suspensão ativa, ou
inteligente, de sua McLaren. Até brincou antes da classificação:“Vamos ver qual
é o QI dela” Não foi suficiente, no entanto, para andar na frente das Williams:
Mansell fez a sua sétima pole position na temporada e o brasileiro ficou em
terceiro no grid.Também não deu para conferir a elevação da potência do novo
motor que a Honda havia preparado para a corrida, pois Ayrton Senna abandonou
na primeira volta. Preparava-se para tomar a primeira curva quando foi
abalroado por Michael Schumacher.Foi uma corrida curta e uma decepção grande.
Nigel Mansell venceu novamente, com Patrese e Martin Brundle (Benetton)
completando o pódio.
Briga de Ayrton Senna com Michael Schumacher
Já
o segundo acontecimento foi o abalroamento
que o piloto brasileiro teve com o então jovem Michael Schumacher . Na oitava etapa, o GP da França , após a largada,
ocupando a 4ª posição, Senna ia contornar a curva Adelaide, quando de
repente foi atingido por trás pelo Benetton
número 19; sem condições de sair do local, Senna abandonou a corrida
prematuramente. Antes de começar a segunda largada, o brasileiro sem o macacão
foi até o grid onde estava posicionado o carro do piloto. O tricampeão
brasileiro queria conversar rapidamente com ele antes de dar entrevistas para a
imprensa. Você fez uma cagada do tamanho de um bonde e me jogou para fora da
pista
disse o piloto brasileiro ao jovem piloto alemão no meio da pista e com o dedo
em riste. Embora Senna quisesse iniciar uma conversa amigável com Schumacher, o
próprio piloto alemão não quis dialogar com o tricampeão naquele momento,
porque não era o local e o momento adequado para essa discussão, já que o
piloto da Benetton estava se concentrando com a equipe para a nova largada. Sem
muito o que fazer, Senna deixou o local, pulou a mureta da pista e foi embora,
deixando a imprensa internacional que estava ao seu redor sem dar maiores
explicaçõesFonte: História de Ayrton Senna http://www.ayrtonsenna.com.br/piloto/
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Senna X Schumacher, no braço. Palco: GP da França de 1992, Magny-Cours
Então com 23 anos, alemão tirou brasileiro tricampeão da prova logo na primeira volta com manobra desastrada; diante das câmeras, um irritado Ayrton foi tirar satisfações e repórter viu de perto
A
corrida representou o segundo round da relação que viria a ser bastante tensa,
ao longo dos anos, entre Ayrton Senna, da McLaren, e Michael Schumacher,
Benetton. O direito de ser o primeiro round ficou com o GP do Brasil daquela
temporada.
Senna
estreou o modelo MP4/7-Honda em Interlagos, terceiro GP do calendário, a fim de
tentar se aproximar um pouco dos pilotos da Williams, Nigel Mansell e Riccardo
Patrese, muito mais rápidos que todos os demais. Na prova, com um carro quase
sem testes, o motor Honda cortava.
Schumacher vinha imediatamente atrás de Senna, na reta dos boxes de Interlagos, e interpretou aquela súbita aproximação à traseira da McLaren como um brake test, ou seja, Senna estivesse tocando de leve no freio, na reta, para tentar levar Schumacher brecar forte e perder o controle da Benetton. - É difícil acreditar que um piloto como Senna, três vezes campeão do mundo, possa ainda fazer break test com os outros - acusou o alemão. Senna ficou sabendo da declaração de Schumacher pela imprensa, instantes depois apenas: - Falou isso, é? Pois o alemão falou besteira. Eu não fiz break test algum. O meu motor estava falhando, tanto que abandonei por essa razão. Antes de entrar no GP da França de 1992 em si, era importante mostrar que, com menos de um ano na F1, Schumacher já tinha desafetos. E do calibre de Senna, campeão em três dos quatro títulos anteriores disputados, 1988, 1990 e 1991.
Chega
pra lá
Ainda na primeira volta, no
fim da grande reta, na freada da curva Adelaide, Schumacher tentou ultrapassar
Senna, por dentro, para assumir o quarto lugar. Senna havia perdido a terceira
colocação para Berger na largada. Sem experiência, ainda, o alemão freou e,
quando ambos iniciaram a curva, bastante lenta, o aerofólio dianteiro de
Schumacher tocou o pneu traseiro direito de Senna, fazendo-o rodar. Outros
pilotos se acidentaram naquela curva.
Mesmo sem o aerofólio
dianteiro, Schumacher voltou aos boxes porque o restante do seu Benetton não
foi atingido. Já Senna não teve como seguir na corrida. Assistiu às primeiras
voltas da área de escape da curva Adelaide.
A corrida seguia seu curso
quando na 16ª volta começou a chover forte, a ponto de a visibilidade cair
bastante e o asfalto tornar-se extremamente escorregadio. O diretor de prova,
Roland Bruynseraede, interrompeu a competição.
Agora vai ficar legal.
Senna já estava de roupas
normais, pronto para deixar a área do autódromo, quando viu, na paralisação da
corrida, a chance de ter uma conversinha com Schumacher. Quem conheceu Senna
sabe que ele não esquecia quando alguém lhe fazia algo. Estava atravessada
ainda na sua garganta a falsa acusação de Schumacher em Interlagos, exatamente
três meses antes, e naquele momento, bem quente ainda, ter sido literalmente
colocado para fora da prova.
Atrás da notícia
Eu estava na cabine de
transmissão da empresa para quem trabalhava, dentre outras atividades que
exercia, quando dei sorte de ver, através do vidro, Senna sair dos boxes da
McLaren e caminhar a pé até o grid, onde os carros estavam parando para depois,
talvez, reiniciar a competição. Há vídeo dessa cena no Youtube.
Avisei o locutor que
estava deixando a cabine e, com o meu gravador de fita cassete na mão, saí
correndo para flagrar o primeiro contato entre Senna e Schumacher, em seguida
ao alemão deixar o cockpit.
Olha que legal, hoje de
manhã, aqui em Paul Ricard, bati um longo papo com Pat Symonds, o engenheiro de
Schumacher na Benetton e que fora de Senna na Toleman. A equipe era a mesma,
havia mudado o nome, apenas. Symonds riu comigo. Hoje esse conceituado
engenheiro inglês faz parte do grupo de Ross Brawn, na FOM, que estuda uma
profunda mudança nos regulamentos técnico e esportivos da F1 a partir de 2021.
- Quando eu vi Ayrton
chegando, logo compreendi que aquilo poderia gerar uma briga mesmo. Eu me
postei bem perto do Michael e lhe pedi para não reagir, ouvisse o que tinha de
ouvir. Ayrton estava de cabeça quente, contou-me Symonds, e eu lhe lembrei que
estávamos lado a lado.
Antes ainda de se aproximar de Schumacher, Senna já
estava de dedo em riste e suas palavras, em tom ameaçador, foram exatamente
estas, as ouvi de perto:
-
Eu vim aqui porque eu te respeito como piloto. Mas também para te avisar que da
próxima vez quem vai dar primeiro sou eu, não você, ok?
A
cara de Schumacher, com seus 23 anos, dizia muito. Cabeça baixa. Foi como o vi
em muitas ocasiões, a mais marcante na sala de imprensa do GP da Áustria, em
2002, depois de vencer após a Ferrari mandar Rubens Barrichello deixá-lo
passar.
Com
os dois pilotos ainda próximos da Benetton, Symonds colocou a mão no ombro de
Senna e disse isto:
-
Ayrton, eu vou pessoalmente conversar com ele.
Se
naquele momento o alemão tivesse encarado Senna, com certeza teriam partido
para a agressão física, o brasileiro estava realmente irritado.
Agora
o Symonds de Paul Ricard:
-
Michael era muito jovem ainda, cheio de gás, cometia erros. Depois de você me
contar agora o que aconteceu, eu me lembrei, ele bateu na traseira de Ayrton.
Recordo que tínhamos um ótimo carro.
De
volta ao acontecimentos da pista, Schumacher diz algo a Senna, já levantando a
cabeça, em tom bastante moderado. Não ouvi, até porque a essa altura eles já
não estavam sozinhos, havia gente de todo lado. A chuva havia parado, segundos
depois da bandeira vermelha.
Você
está errado, ponto!
Senna pôe a mão no
ombro de Schumacher e o leva para a lateral do grid. Os mecânicos, de todos os
carros, trabalham para mandá-los de volta à corrida. Senna nos impede de
registrarmos a conversa, empurra o braço de um repórter com o microfone. Mas,
por eu estar muito perto, ouvi, sempre falando em inglês com Schumacher:
- Você está errado.
Você está errado, não há o que discutir. Você não colocou o carro ao lado do
meu, bateu na minha roda traseira, não foi nem uma tentativa de ultrapassagem.
Você está errado, pergunte a quem você quiser. O tom de Senna é menos agressivo
do que no começo das conversas.
O alemão fala algo e de
novo não deu para ouvir. Flavio Briatore, um jovem dirigente da F1 então, se
aproxima lentamente. Eu me lembro que me chamou a atenção o medo de Briatore
chegar perto de ambos. Hoje, aos 68 anos, o italiano reside em Mônaco, e quando
o encontro por lá, o que aconteceu em duas ocasiões, desde que deixou a F1,
costumamos conversar. Briatore é o profissional que mais coisas me contou
nesses meus quase 30 anos de F1. Muitas mesmo.
Vi que Senna e
Schumacher mantiveram ainda aquele papo no grid, mas sem poder ouvi-los, me
parecia a repetição do que já haviam falado um ao outro.
Com a imprensa brasileira
Falamos com Senna, nós da imprensa brasileira, na sequência, mas já no
paddock, na parte de trás dos boxes. Antes, um grupo de meninos que
aguardava Senna tentou obter um autógrafo do ídolo. Senna passou por
eles sem olhar para os lados por causa da raiva que sentia de
Schumacher.
Um pequeno grupo o acompanhou, e Senna parou:
- Meninos, já disse que não vou dar autógrafo agora, estou irritado, ok?
Vi aquilo e confesso que me senti doído, os meninos não tinham nada a
ver com os problemas entre Senna e Schumacher. Veio até nós,
jornalistas. Recordo de ter do meu lado Celso Itiberê, do jornal "O
Globo". As palavras de Senna ainda guardo em mente. Foi algo assim:
- Esse alemão, que é bom, não vai chegar aqui e se impor como está
achando. Se vocês observarem as imagens vão de cara entender que não foi
uma tentativa frustrada de ultrapassagem, ele provocou um acidente, é
diferente, ele me colocou para fora. E não fizeram nada contra ele. O.K.
(deu a entender haver compreendido a regra do jogo).
Disse mais coisas que não me lembro.
Faz uns 15 anos, creio, achei uma caixa de fitas de gravador cassete
com as entrevistas ou flagrantes que registrava na época. Com certeza em
uma delas encontraria essa conversa, ao menos o que consegui gravar.
Nas mudanças Brasil/Europa, essa caixa e muitas outras literalmente
sumiram. Mas quem sabe eu ainda a encontre na casa da Mamma. Um
documento que se perdeu.
Importante: sobre acidentes de pilotos, na época não existia nem 20% do
rigor de hoje nos toques ocorridos na pista. Era preciso muito para os
comissários tomarem alguma ação punitiva contra os pilotos. Acredito que
se Senna acompanhasse um GP de perto hoje e visse que tudo pode gerar
punição, é bem provável que desse risada.
Fama
de mau caráter
Essa foi uma
experiência interessante que tive com Schumacher e Senna. A maior, no entanto,
nada teve a ver com a de Magny-Cours. Aconteceu muitos anos mais tarde, anos
2000. Um dia prometo contar. Eu entrevistaria Schumacher em São Paulo, em um
hotel, na quinta-feira do fim de semana do GP do Brasil, para o jornal que trabalhava.
Minha estratégia era
arriscada: ou a entrevista seria um marco ou ela talvez acabasse na primeira
pergunta e ficasse sem nada. Schumacher literalmente iria embora. Como o
conhecia há muitos anos, já o havia entrevistado em várias ocasiões, achei que
valeria a pena correr o risco.
A pergunta:
- Michael, por que você
acha que tem fama de ser mau caráter?
Não houve, a rigor,
segunda pergunta. E a entrevista marcou época. Schumacher falou quase sem parar
a maior parte do tempo, mais de 20 minutos, para desespero da assessora de
imprensa, revoltado com o que algumas pessoas pensavam dele. Disse-me que
outros pilotos, que tiveram comportamentos até piores que os seus, não foram
punidos e ainda “tinham a imagem de santinho”.
Até a próxima.
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